Ministro do STF esclareceu ao comandante Tomás Paiva que não há nada contra o general Richard Nunes nas investigações sobre assassinato de Marielle Franco
O ministro Alexandre de Moraes determinou a prisão dos envolvidos no assassinato de Marielle Franco. | 📷 Divulgação/STF
O ministro Alexandre de Moraes, relator do caso Marielle no Supremo, telefonou para o comandante do Exército, general Tomás Paiva, para dizer que não há absolutamente nada contra o general Richard Nunes no inquérito conduzido pela Polícia Federal. O telefonema veio na hora certa, quando o também general Braga Neto tenta empurrar para Richard a “culpa” por nomear para a direção da Polícia Civil no Rio o delegado Rivaldo Barbosa, que foi preso no domingo, não apenas por obstruir provas como por ter participado diretamente do planejamento do assassinato de Marielle Franco e Anderson Gomes.
Sempre tão implacável, Xandão, que também é relator e personagem chave nas investigações sobre a trama do golpe de Estado e outros inquéritos sobre o governo passado, está numa semana que não chega ao extremo de ser paz e amor, mas de esclarecer circunstâncias e reduzir confrontos e tensões desnecessárias. Além de defender o general Richard, informou ao seus pares no Supremo que não dá bola para o “asilo” de duas noites de Jair Bolsonaro na embaixada da Hungria quando a PF lhe retirou o passaporte.
O fato foi divulgado pelo The New York Times e confirmado pelos advogados do ex-presidente, mas Moraes não vê elementos para prisão preventiva por risco de fuga e obstrução de Justiça. Segundo relatos, minimizou para colegas de toga nessa linha: Bolsonaro dormiu lá na embaixada, voltou, participou de manifestação e está rodando o País, e daí? Confirma-se a previsão de que Bolsonaro só será preso se for condenado e depois do trâmite em julgado, sabe-se lá quando.
De volta a Marielle e Anderson, os dois generais Braga Neto e Richard Nunes são a personificação da divisão intencionalmente criada nas Forças Armadas na era Bolsonaro. Braga Neto, depois ministro e candidato a vice na chapa de Bolsonaro em 2022, era interventor na Segurança Pública do Rio e foi quem assinou a nomeação do delegado Rivaldo para a Polícia Civil. Richard, legalista, antigolpe, aliado do atual comandante Tomás e próximo chefe do Estado Maior do Exército, era secretário de Segurança.
A reação de cada um depois da prisão de Rivaldo entre os mandantes do assassinato de Marielle diz muito sobre quem são. Via advogados, Braga Netto tirou o corpo fora, alegou que sua assinatura era “burocrática” e jogou a bomba no colo de Richard. Já Richard atendeu a jornalistas e, de viva voz, assumiu que a escolha de Rivaldo foi dele, que não tinha a menor ideia do quem ele realmente era e ficou tão chocado quanto as próprias famílias de Marielle e Anderson ao saber do que ele foi capaz.
Richard também explicou que seu preferido para a Polícia Civil era outro, que recusou. Admitiu que havia ressalvas na corporação à conduta de Rivaldo, mas, se para alguns essas ressalvas eram consideradas graves, Richard considerou um disse-que-disse, uma intriga típica de corporações, nada perturbador e comprovado. E acrescentou um dado da realidade do Rio, que a Defesa e o Exército reproduzem: afinal, se fosse para levar a sério o que havia contra Rivaldo, quem sobraria? É o caso de apurar exatamente o que diziam os relatórios de inteligência de 2018 sobre Rivaldo.
O fato é que, no Rio, cada vez mais no Brasil inteiro, o crime organizado, as milícias e a contravenção estão embolados e infiltrados nas instâncias dos poderes Executivo, Legislativo e judiciário, a ponto de o cidadão e a cidadã já não saberem quem é quem e em quem confiar.
Por Eliane Cantanhêde/Estadão