OPINIÃO | Brasil pode ter 1 milhão de assassinos nas ruas; entenda

Violência mina confiança, base do crescimento econômico no longo prazo


Suzane von Richtofen e os irmãos Cravinhos na época do assassinato. | 📷 Agliberto Lima/Estadão

Tenho um desafio para ser usado em processos seletivos. É dessas perguntas que ninguém sabe a resposta, mas que é feita para ver como os candidatos raciocinam. A pergunta é: quantos assassinos soltos existem no Brasil?

Estreou a série Tremembé, sobre criminosos famosos: Suzane von Richthofen e os irmãos Cravinhos, o casal Nardoni, Elize Matsunaga.

Todos já saíram do regime fechado. Quantos outros? Para saber quantos homicidas estão nas ruas, a quantidade de homicídios é um bom ponto de partida. Considerando apenas os assassinatos deste século, seriam 1,2 milhão.

Pelos dados do governo federal, o número de presos em regime fechado é bem menor, cerca de 360 mil. Para que não nos acusem de sermos viesados, vamos arredondar os homicídios para baixo, a 1 milhão, e arredondar os presos para cima, a 500 mil.

A diferença entre a quantidade de assassinatos e a quantidade de pessoas presas seria de 500 mil, mas esse é um número ainda muito simplista. Em primeiro lugar, porque há pessoas presas que podem não ser assassinas. Diante da falta de bons dados, o candidato teria que fazer estimativas aí.

Em segundo lugar, porque a relação entre homicídios e homicidas não é simples. Há crimes com mais de um assassino, como Suzane e os Cravinhos. E há assassinos com mais de um crime, como o Maníaco do Parque ou os próprios reincidentes do sistema, como aquele sujeito no Sul que concretou a própria mãe, foi condenado e logo solto, e então colocou a namorada esquartejada em uma mala.

Estimar o número de assassinos livres no Brasil precisa levar em consideração também que é comum que assassinos sejam eles próprios vítimas de assassinatos, como em guerras de facções. Há, ademais, os que podem ter morrido de causas naturais ao longo do tempo. De outra parte, é raríssimo que assassinos do trânsito fiquem na cadeia.

Independentemente das contas que você faça, a resposta será assustadora. A conclusão seria de que o Brasil tem 300 mil, 500 mil ou até mais de 1 milhão de assassinos soltos (com probabilidade alta para este último).

Esbarramos com quantos ao longo de nossas vidas?

Como normalizamos isso? O Presidente do Banco Central falou outro dia sobre o aumento da violência. Disse que não é algo que ele inclui nas projeções da autoridade monetária, mas destacou que a confiança é a base do sucesso da economia, e esse capital social é ameaçado pela guerra entre facções. “É com certeza uma tendência preocupante, também de uma perspectiva econômica no longo prazo”, disse Erik Thedéen, do Riksbank, preocupado com o crescimento da violência na Suécia.

Por Pedro Fernando Nery/Estadão
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